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quinta-feira, 7 de julho de 2011

Cordão de Ouro, o filme

um clássico da capoeira

Feito em 1976, o filme Cordão de Ouro representa um marco na história da capoeira no cinema nacional. Realizado em plena ditadura militar, o longa surpreende ao contar a história de um escravo que se rebela contra o sistema.

Num país fictício, Eldorado, Jorge é escravo de uma companhia de mineração de selênio, a Cia Progresso de Eldorado. Revoltado com a exploração de seu povo ele foge e recebe ajuda do Caboclo Cachoeira para escapar dos capatazes, que o perseguem de helicóptero. O Caboclo o conduz às sagradas terras de Aruanda, um “mundo feliz”, “a morada do bem, onde os rios são dourados da cor do mel e a mata é verde da cor das esmeraldas e no ar brincam para sempre as risadas felizes dos filhos de Oxalá”, como se diz numa das sequências mais poéticas do filme. Lá, Jorge conhece seu mentor espiritual, o orixá Ogum, que o espera para batizá-lo e testar suas habilidades no jogo da capoeira. Satisfeito, entrega-lhe também um amuleto de proteção – um cordão de ouro, com a estrela de Salomão – que vai “manter seu corpo fechado enquanto tu tiver coragem de olhar dentro dos olhos dos teus inimigos” e lhe confia a missão de voltar a Eldorado para lutar ao lado de seu povo contra as “falanges do mal”.

roda de Capoeira em Aruanda, com Mestre Leopoldina, Mestre Camisa e Nestor Capoeira, um verdaderiro clássico

O filme conta com um célebre elenco de capoeiristas: Nestor Capoeira (Jorge), Mestre Camisa (pintado de preto, como Ogum), Mestre Leopoldina (em seu impecável terno branco, no comando da bateria da roda em Aruanda), Mestre Peixinho e outros. Temos ainda uma participação do saudoso Pai José Ribeiro, numa cena em seu lendário terreiro de candomblé, o Castelo de Iansã Egum-Nitá. Atores como Antonio Pitanga, Zezé Mota e Jofre Soares completam o elenco do longa, dirigido pelo consagrado Antonio Carlos Fontoura.

Carregado de símbolos da religiosidade afro, indígena e da cultura popular, numa exuberante estética de vanguarda, o filme é de grande importância para quem se interessa a fundo pela história da capoeira, do cinema e da cultura nacional.

(Soldado Capoeira)

domingo, 5 de junho de 2011

A história do maculelê

O maculelê é uma das manifestações que compõe a gama de atividade praticadas tradicionalmente em conjunto com a capoeira. Mais do que isso, é considerado pelos capoeiristas  como parte da capoeira.

Ao longo do tempo, várias foram as explicações, entre lendas e fatos reais, dadas para explicar o seu surgimento.

A lenda mais conhecida relata que em uma tribo africana havia um rei (o rei Maculelê) que após beber demais teve sua tribo atacada por uma tribo inimiga, justamente quando os homens e guerreiros da tribo haviam saído para caçar. Incapaz de defender as mulheres, crianças e idosos o rei acabou por ser assassinado junto a eles. De volta ao local, os homens e guerreiros encontraram o cenário desolador.

O curandeiro da tribo, no entanto, deu ao rei uma nova dose da mesma bebida (a famosa jurema, feita com a raiz da árvore de mesmo nome, sagrada entre os índigenas do nordeste) que o havia embriagado antes do ocorrido e o mesmo surpreendentemente ressuscitou. Vendo então a desgraça de seu povo, o rei Maculelê jura vingança e junto a seus guerreiros ataca e derrota a tribo inimiga, munido apenas de bastões de madeira.

A lenda mostra a intensa miscigenação entre as culturas no Brasil. Uma tribo africana e uma bebida sagrada entre os índios. Provavelmente, em seu surgimento essa lenda não citasse especificamente a jurema, uma vez que essa bebida não vem da África, mas outra bebida que durante a miscigenação cultural foi substituída pela jurema, tão popular no nordeste.

Outras versões dessa lenda existem, mas quase todas são muito parecidas.

A história oficial cita o berço baiano do maculelê e sua origem africana. Sobre isso, vejamos esse precioso documentário, que fala do maculelê, Mestre Popó, seu mais importante nome e da famosa cidade de Santo Amaro da Purificação:

A verdadeira história do maculelê–direção e roteiro, Almir Nascimento, produção, Pedro Urizzi, realização “Studio A”.

(Soldado Capoeira)

terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

A capoeira como interface cultural

O Brasil é um país rico em cultura. As diversas etnias formadoras do povo brasileiro ao se miscigenarem nos deixaram um legado amplo e variado. Cada região tem suas características culturais próprias, e a cultura popular é a marca mais forte do nosso país.

Como diz Paulo César Pinheiro, na célebre canção “Brasil Mestiço, Santuário da Fé”, interpretada por Clara Nunes, “é o samba, é o ponto de umbanda, é o tambor de Luanda, é o maculelê e o lundu, é o jongo e o cachambu, é o cateretê, é o coco, é o maracatu, o atabaque de caboclo, agogô de afoxé, é a capoeira e o candomblé...”.


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o mundo se globaliza, mas a identidade brasileira se reafirma

Toda essa cultura se mantém viva graças a força de resistência de quem a pratica.

Com a crescente evolução das tecnologias de informação cresce também o processo de “globalização cultural”, levando comunidades e indivíduos no mundo todo a se questionarem sobre a sua própria identidade. Se manter fiel às suas tradições ou atender ao chamado do que está “na moda” e representa status, modernidade...?

Embora boa parte da juventude prefira a segunda opção, existe também essa força de resistência. E a medida que o Brasil emerge, a história se inverte, de “importador” cultural o país passa a ser campo de interesse de estrangeiros e torna-se cada vez mais um “exportador” cultural.

A capoeira desempenha um papel peculiar nesse processo, funcionando como uma espécie de interface. Nela existe espaço para outros tipos de manifestação, como coco de roda, samba, puxada de rede, afoxé, jongo, etc, possibilitando que tais manifestações também sejam preservadas e divulgadas, por vezes em ambientes os mais diversos ao natural. A capoeira se espalha pelos cinco continentes conseguindo incrivelmente preservar sua identidade brasileira, através da linguagem, da organização, do respeito a sua história...

Muita gente pode se lembrar do samba e do futebol quando ouve falar do Brasil. Mas foi a capoeira e os capoeiristas que se radicaram mundo afora para ensinar pessoalmente aos estrangeiros o jeito de ser brasileiro - ela implantou um pouco de Brasil em cada canto do mundo e é umas principais portas de entrada para a cultura nacional.

Por isso é tão importante que se valorize cada vez mais esse aspecto abrangente da capoeira com as outras manifestações culturais do Brasil, até porque a própria capoeira tende a se fortalecer com isso. Um estrangeiro que se interessa pela capoeira, quer conhecer sua história, quer cantar em português, quer aprender tudo quanto for da nossa cultura, quer beber a água na fonte, o original. É um interesse dele, pois assim poderá se sentir verdadeiramente capoeirista, e até mesmo um pouco brasileiro.

(Soldado Capoeira)

Ouça:

Paulo César Pinheiro e Mário Duarte – música Brasil Mestiço, Santuário da Fé, 1980.